As dúvidas e angustias de uma mãe de primeira viagem quando descobre que o seu tesouro é especial...

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Finalmente, uma trégua...

Ser mãe (ou pai) é uma aventura. Regra geral é uma aventura agradável. Depois vem o autismo e estraga tudo e tira-nos toda a vontade de fazer o que quer que seja. E com muita força, muita calma e muito amor, um dia de cada vez, lá voltamos à aventura, desta vez uma aventura diferente, com partes muito boas e algumas menos boas. Mas voltamos. Sempre.

O problema com esta aventura, que a maioria dos pais não conhece e não faz ideia o que significa, é que andamos, sempre, SEMPRE, com o coração nas mãos. Ou porque associado ao autismo há uma perturbação de sono, ou porque o nosso filho tem um conjunto de pilhas Duracell incorporado, ou porque vivemos numa sociedade parva, ou porque as escolas não dão respostas adequadas, ou porque os nossos filhos não sabem comunicar... Ou, no meu caso, todas as anteriores, em simultâneo. E mais algumas. A mais recente e aquela que mais dificil é de suportar, é quando o nosso filho autista tem dores e não sabe explicar onde e quando se tenta ajudar, ele não deixa. Assim se passou o ultimo mês e meio cá em casa. Com dores de dentes.

Já tinhamos tentado a abordagem tradicional em dentistas. Escolhemos uma dentista pediátrica (2012, post aqui), que fez o seu melhor, mas estragou tudo, porque a partir daquele dia, ninguém (nem mesmo eu) mexe na boca do garoto. Se eu soubesse na altura o que sei hoje, nunca teria permitido que agarrassem o Diogo à força...

Dia 1 de Março, fomos a Coimbra às urgências do Hospital Pediátrico. Nada se resolveu porque o sistema assim o determina. Mas cabe na cabeça de alguém que exista uma lista de espera de 12 meses para uma cirurgia com anestesia geral para utentes pediátricos? Não, não se enganaram a ler! O Diogo teria que esperar 1 ano até ter vaga no bloco operatório, onde finalmente lhe iriam tratar a cárie. Marcaram consulta para dia 11 de Abril (hoje), para o poderem observar e finalmente, entraria na lista. Bah. Isto com muitos telefonemas e pedidos desesperados... ficou apenas uma promessa de tentar acelerar alguns meses...
Duas rondas de antibióticos e um mês de Brufen/ben-u-ron depois, continuavam as dores, fartei-me e parti à procura de alternativas.

Fiz a pesquisa e peguei no telefone.
5ª feira, 3 de Março, 9.30h.
O que eu procurava era "simples": um local onde fizessem o tratamento ao Diogo, com anestesia geral e com acordo ADSE, o mais rápido possível.
Eis os resultados:
- Hospital da Luz: não entendo todo o deslumbre que se associa ao HL. Sinceramente. Ao telefone, parece que o que estava a pedir era demasido estranho, nem sabiam se a ADSE tinha acordo com a estomatologia ou não. Ficaram de pensar no assunto e ligar de volta com orçamento. Até hoje...
- CliRia (Aveiro): finalmente, alguém acessível. Falei diretamente com a pessoa responsável pela intervenção (muito acessível e cordial). Fazem o procedimento, mas precisa de ser avaliado em consulta primeiro. Têm acordo com ADSE mas não sabem o que cobre o acordo. Preço base de entrada no bloco operatório: 5000€. Sim, CINCO MIL EUROS a que acresceriam todos os tratamentos efetuados no bloco.
Foi exactamente isso que eu pensei...
- Clínica Pissarra Gomes (Covilhã): falei directamente com o responsável, extremamente atencioso e prestável. Fazem procedimento mas anestesista fora em congresso. Ficam de ligar assim que falassem com a anestesista.
- IDEALMED (Coimbra): falei diretamente com a Drª Andrea, responsável pela intervenção em bloco operatório. Fizemos consulta pelo telefone, foi extremamente atenciosa e compreensiva. Disse que estava a pensar fazer o procedimento nas próximas duas semanas e perguntou se eu concordava. Como eu respondi que "se for hoje, eu já vou a caminho" só me respondeu "vou falar com a equipa, já lhe ligo". E ligou, passado sei lá, meia hora: "cirurgia depois de amanhã, sábado, pode ser?". Pode, claro que pode. Nem que eu tenha que fazer um empréstimo ao banco, eu só quero o meu filho bem...

Uma hora depois, liga-me o Dr. Pissarra, da Covilhã, a quem eu agradeço a atenção do fundinho do meu coração de mãe. "Eu também sou pai e nem quero imaginar o que a senhora sente ao ver o seu filho sofrer. Como não consegui falar com a nossa anestesista, liguei para alguns colegas meus a perguntar onde se poderia fazer este procedimento e disseram-me que a pessoa indicada seria a Drª Andrea, no Idealmed." É pá, nem vos conto o alívio que senti ao perceber que estava no bom caminho!

Sábado, 5 de Abril, 10 horas.
Entramos no Idealmed, onde já estão à nossa espera. Acompanham-nos ao quarto (de luxo!) onde alguns minutos mais tarde nos encontra o anestesista. Depois das perguntas da praxe, segue-se a longa espera até às 15 horas, sem comer ou beber (acho que isso foi o mais complicado, com uma peste que tem que estar sempre a roer!).
Recebemos a visita da drª, chega o xarope-maravilha que acalma o pequeno e lá vamos para o bloco operatório. Sim, leram bem, vamos. O Diogo foi ao meu colo para o bloco operatório, acordado. Fui eu que o deitei na mesa e que ajudei a por a máscara para o adormecer. Essa sim, é uma sensação do c@%$lho, de completa impotência e desespero. Respirei fundo e saí do bloco, ainda estava o pai a vestir a roupa para entrar. Saímos e esperámos. Duas horas depois, chamam-nos no quarto, já estava! Corremos para o bloco, onde estavam à nossa espera para o acordar e seguimos para o recobro.
Arrancaram o dente que estava a causar problemas (cárie), desvitalizaram outro, trataram os potenciais problemáticos e os que estavam bem, foram selados para que não dessem problema. Tudo dentes de leite, tudo tranquilo com os definitivos!!! (YAY) BOCA NOVA!
Acordou um bocadinho chateado porque ainda tinha o soro (que só puseram quando já estava a dormir) e assim que lho tiraram voltámos para o quarto onde começou a odisseia... da comida! Assim que acordou por completo comeu 4 iogurtes. Meia hora depois chegou o jantar e 15 minutos depois, o segundo jantar (porque o primeiro era só a entrada). Mais tarde chegam mais 3 iogurtes, porque alguém só pedia comida e finalmente, por volta das 22h tivemos alta! E quando chegámos aos avós, sai a ceia: sopa, arroz e carne!
Dormiu a noite toda e no dia seguinte (domingo), às 11 horas a drª Andrea já estava a ligar a perguntar como estava.
É nos detalhes que está a diferença:  não agarraram à força, só puseram o soro quando ele já estava adormecido, os pais sempre presentes, o acompanhamento depois... Ainda fomos elogiados pela excelente higiene oral do pequeno! A cárie foi mesmo provocada por andar sempre a comer...

Sim, também vos digo em quanto ficou o estrago. Uma cirurgia destas fica sempre entre 1500 e 2000€. Nós pagámos 350€ por causa do acordo com a ADSE. Teria pago os 5000€, não sei como, mas teria. Eles têm acordo com as principais seguradoras, o preço será semelhante.

O que é certo é que o Diogo está sorridente, brincalhão e cheio de mimo, desde o momento em que saiu do bloco. Anda super bem disposto, já não toma analgésicos desde domingo... Eu e o pai, companheiro de aventuras, estamos a recuperar de muitos dias aflitivos e retomamos finalmente as "actividades sociais" da internet.


Ainda acham que a saúde publica em Portugal anda bem? Só tenho pena de quem não pode seguir o mesmo caminho...
Tenho que falar... senão dou em doida!

Todos dizem que está tudo bem mas o meu mundo desaba num segundo... Decidi escrever um blog (porque não?), onde vou desabafando e limpando a alma.

Quantos pais não estarão na mesma situação? Ter um filho diferente e não ter certeza de nada? Receio do futuro? E quanta ansiedade muitas vezes não significa NADA? Ou seja, passar 5 ou 6 anos com o coração nas mãos e depois está tudo bem, era só "uma questão de ritmo"? No meu caso, ainda continuo com a malvada incerteza, mas quem sabe...

E porque não desabafar aqui também? Terapia gratuita...
comentários, agradecem-se!